Artigo
16/01/23

A expansão do uso da CPR no financiamento do agronegócio

Por Juliana Regueira

O agronegócio foi o responsável por 27% do PIB do Brasil em 2021, com uma estimativa atual de fechar 2022 com o percentual de 25% do PIB total[1]. A Cédula de Produto Rural (CPR) é hoje um dos seus principais instrumentos para financiamento de toda a cadeia produtiva, comercial e financeira do setor.

A CPR foi instituída pela Lei 8.929/94 e é um título representativo de promessa de entrega de produtos rurais, isto é, representa uma entrega futura de produtos contra a tomada de crédito. O seu intuito foi, desde a sua criação, fomentar e financiar todas as atividades do agronegócio. E diga-se: missão alcançada com louvor! Uma vez que ela pode ser emitida em favor de bancos, de investidores, de fornecedores e outros credores de interesse, foi possível estabelecer uma linha direta entre produtor e financiadores do setor, sem a intermediação bancária[2]. Desde a sua criação, duas grandes alterações legislativas foram responsáveis por torná-la cada vez mais apta a atender o mercado do agronegócio, sobretudo aquelas introduzidas pela Lei 13.986/2020 (Lei do Agro) e pela Lei 14.421/2022 – a Lei do Agro 2, como ficou conhecida.

Em breve resumo, sendo a CPR um título de crédito representativo de promessa de entrega futura de produtos rurais, foi a Lei do Agro que conceituou o que seria produto rural para fins da legislação e, com o advento da Lei de Agro 2, o conceito foi expandido. Com notória propriedade, defende Marcus Reis tratar a CPR de título de crédito híbrido, com propriedades cambiariformes e de contrato civil, posto a previsão legal que determina que “sem caráter de requisito essencial, a CPR, emitida sob a forma cartular ou escritural, poderá conter outras cláusulas lançadas em seu contexto”. Sem dúvidas, concordo que esta é a melhor definição da natureza jurídica deste título, pois além dos requisitos formais definidos pelo grande autor, justamente em decorrência deles, as partes envolvidas podem estruturar as cláusulas e condições adequadas aos mais diversos negócios jurídicos que a CPR formaliza ao instrumentalizar a tomada de crédito.

Como inovação legislativa de 2022, a Lei do Agro 2 merece grande destaque diante do grande impacto sentido quando de sua publicação – que trouxe novos ares e ânimo para o setor.

Assim, hoje, conceitua-se produto rural como aqueles produtos obtidos nas atividades agrícola, pecuária, florestal, extrativismo vegetal e de pesca e aquicultura, seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômico, inclusive quando submetidos a beneficiamento ou a primeira industrialização, bem como a industrialização propriamente dita.

Se a Lei do Agro inovou ao disciplinar sobre a CPR financeira (CPR-f), permitindo a liquidação financeira do título, a Lei do Agro 2 foi além e instituiu a CPR Verde, que é aquela emitida para a captação de recursos para a conservação, recuperação e manejo sustentável de florestas nativas e dos respectivos biomas, além da recuperação de áreas degradadas, bem como para a prestação de serviços ambientais na propriedade rural. Ainda, a Lei do Agro 2 possibilitou, também, que a CPR seja emitida para levantamento de recursos para a atividade de produção ou de comercialização de insumos agrícolas, de máquinas e implementos agrícolas e de equipamentos de armazenagem.

E as alterações não param por aí. Além da ampliação do conceito de produto rural e do rol dos legitimados para emitir o título, trouxe regras mais claras em relação à assinatura eletrônica aceita para emissão da CPR; a obrigatoriedade de identificação do preço e, quando aplicável, do índice de preços utilizado para composição do valor da CPR-f; o aumento do prazo para registro ou depósito da CPR em entidade autorizada pelo Banco Central, sendo, de até dez dias úteis da emissão para aquelas emitidas até 10/08/2022, e em até 30 dias úteis contados a partir da data da emissão para aquelas emitidas a partir de 10/08/2022.

Soma-se ao já exposto que, desde 2020, com a Lei do Agro, a CPR vem se aperfeiçoando, passando o poder ser emitida sob a forma cartular ou escritural, devendo, para ser negociada, estar registrada ou depositada em entidade autorizada pelo Banco Central a exercer a atividade de registro ou depósito centralizado de ativos financeiros. Assim, nos termos da Resolução CMN 4.870/2020 e 4.927/21, atualmente devem ser registradas as CPR com valor superior a R$ 250 mil, valor esse que foi reduzido para R$ 50 mil a partir de 1/1/2023.

Qual é o real impacto disso no mercado? De acordo com o Boletim Derop – Crédito Rural e Proagro[3], de setembro de 2022, há atualmente um estoque de R$ 193 bilhões em CPR, considerando os registros conjuntos na B3[4], Cerc[5] e CRDC[6]. A expectativa é que esse estoque seja significativamente aumentado a partir de 2023, dada a redução do limite de valor, como exposto.

Números também empolgantes podem ser verificados no Boletim CVM Agronegócio, divulgado pela primeira vez pela CVM em 20/12/2022, e que será publicado trimestralmente pela autarquia. Pode-se verificar que, na data-base de setembro de 2022, as CPR aparecem em segundo lugar como lastro na estruturação das operações de emissão de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), compondo R$ 8,4 bilhões dos lastros em estoque na data-base de setembro de 2022. Em relação à composição da carteira de Fiagro (Fundo de Investimento do Agronegócio), sob denominação Fiagro Direitos Creditórios, dentre o saldo que compõem os R$ 679 milhões relacionados aos Direitos Creditórios têm PRF e PRF-f em sua composição.

Em suma, verifica-se que o financiamento do agronegócio tem ganhado relevante e merecido destaque no cenário nacional, vez que se trata da força motriz do PIB nacional. Tanto a Lei do Agro quanto a Lei nº 14.421/2022 trouxeram alterações importantes para o setor, aperfeiçoando as regras referentes ao financiamento privado, proporcionando maior solidez e segurança jurídica, fortalecendo e inovando institutos já consagrados, como a CPR, bem como novos, como o FIAGRO, inserindo-os de forma definitiva no desenvolvimento e sustentabilidade do setor.

[1] (https://www.cepea.esalq.usp.br/br/pib-do-agronegocio-brasileiro.aspx#:~:text=Cepea%2C%2021%2F09%2F2022,no%20primeiro%20semestre%20deste%20ano.) acesso em 21/12/2022, 10h08

[2] REIS, Marcus, Crédito Rural: teoria e prática, 2ª edição, Rio de Janeiro, editora forenses, 2021.

[3] (file:///C:/Users/julianaregueira/Downloads/Boletim%20Derop%20-%20Setembro2022%20(1).pdf), acesso em 21/12/2022, às 11h23.

[4] https://www.b3.com.br/pt_br/

[5] https://www.cerc.inf.br/

[6] https://crdc.com.br/

 

Fonte: Jota